sexta-feira, 27 de maio de 2016



 Cecília Meireles
(...) Tu és folha de outono 
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
E vou por este caminho,
certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...

                                 E se me achar esquisita,
                                 respeite também.
                                 até eu fui obrigada a me respeitar.
                                                       Clarice Lispector
Hoje estou assim, poética, talvez a dureza dos dias, refugio-me então na poesia alimentando a alma carecida de doçura.

Clarice Lispector


Sou composta por urgências: 
minhas alegrias são intensas; 
minhas tristezas, absolutas. 
Entupo-me de ausências,
Esvazio-me de excessos. 
Eu não caibo no estreito, 
eu só vivo nos extremos.

Pouco não me serve, 
médio não me satisfaz,
metades nunca foram meu forte! 

Todos os grandes e pequenos momentos,
feitos com amor e com carinho,
são pra mim recordações eternas.
Palavras até me conquistam temporariamente...
Mas atitudes me perdem ou me ganham para sempre.

Suponho que me entender 
não é uma questão de inteligência 
e sim de sentir, 
de entrar em contato...
Ou toca, ou não toca.

Wislawa Szymborska


Mapa

Plano como a mesa
na qual está colocado.
Debaixo dele nada se move
nem busca vazão.
Sobre ele —meu hálito humano
não cria vórtices de ar
e deixa toda a sua superfície
em silêncio.
Suas planícies, vales, são sempre verdes,
os planaltos, montanhas, amarelos e marrons
e os mares, oceanos, de um azul delicado
nas margens fendidas.
Tudo aqui é pequeno, próximo, acessível.
Posso tocar os vulcões com a ponta da unha,
acariciar os polos sem luvas grossas.
Com um olhar posso
abarcar cada deserto
junto com o rio logo ali ao lado.
Selvas são assinaladas com arvorezinhas
entre as quais seria difícil se perder.
No Ocidente e Oriente
acima e abaixo do equador —
assentou-se um manso silêncio.
Pontinhos pretos significam
que ali vivem pessoas.
Valas comuns e súbitas ruínas
não cabem nesse quadro.
As fronteiras dos países mal são visíveis
como se hesitassem entre ser e não ser.
Gosto dos mapas porque mentem.
Porque não dão acesso à dura verdade.
Porque, generosos e bem-humorados,
estendem-me na mesa um mundo
que não é deste mundo.